quarta-feira, dezembro 29, 2004

Encarar a vida por si mesmo

Não resisto a mais outra :)

Durante todo o tempo que estive aqui, neste sesshin, o zazen quebrou o meu habitual modo de vida. Parece ser mais fácil em grupo; apoiamo-nos mutuamente e em conjunto parece que criamos algo. Mas o que sucederá depois, uma vez terminado o sesshin, quando tiver de encarar a vida por mim mesmo, sem um mestre? A minha vida parece-me geralmente tão fragmentada, sem nenhuma coordenação. Apenas desordem e desatenção. Procuro encará-la de frente, mas são tantas as possibilidades que se me apresentam, que às vezes sinto-me demasiado insignificante para as enfrentar a todas.

"Desordem? Não há mal nenhum nisso: a minha vida também é desordem. Talvez a excessiva elementaridade do zazen não permita que o tomes a sério nem que o tragas mentalmente contigo. Mas talvez haja momentos em que estejas ciente do ar que respiras e da água que bebes. Ambos também nos são tão familiares que nem lhes prestamos atenção, normalmente todos nos esquecemos deles.

A simplicidade do sentar e do respirar permite-nos a plena consciência de esta simplicidade cósmica. A trindade do zazen é a vida natural e original; mas sempre que vos explico isto, a vossa tendência é para o esquecer. Do mesmo modo, esquecem-se do ar que respiram e da roupa interior que vestem todo os dias!

Por favor, não te preocupes com o amanhã. Não é já suficiente encontrarmo-nos aqui? Eu não acho que tenhas razão quando dizes não teres um mestre na tua via diária. É provável que não tenhas um mestre específico que possas seguir e em quem tu possas confiar, mas será que não podes ver por ti próprio se andas no Caminho Aberto, sem esse agente de viagens?

Se realmente encontraste isto, já encontraste o teu verdadeiro mestre. Não é necessário que sigas pelo caminho comigo; o que é necessário é seguires o teu próprio Buda em ti.

O que criamos nós juntos? Sempre que pessoas se encontram em grupo, geram-se diferentes tipos de atmosferas, umas positivas outras negativas.

Nessas circunstâncias, é possível ser-se profundamente inspirado, tanto pela amizade espiritual como pela harmoniosa energia que é liberta pelo trabalho e pela prática. Pode também suceder, por outro lado, sermos facilmente arrebatados e cegarmos com a euforia gerada em todos os diferentes níveis psicológicos e emocionais.

Às vezes, há grupos que confiam na energia colectiva para fortalecer as suas práticas ou para encorajarem individualmente a «transformação» nos participantes. É inevitável sermos tocados, mais tarde ou mais cedo, por todos esses tipos de atmosferas ou pelas actividades em grupo. A resposta depende muito de se ter ou não encontrado a sua própria e real direcção na Vida."